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Green Day dá a volta por cima com ‘Saviors’, um de seus discos mais fortes

O que esperar do 14º álbum de uma banda de rock que há pelo menos 30 anos desfruta do estrelato mundial? Em geral, não muito, mas aqui se trata do Green Day – trio californiano que deu algumas voltas por cima em sua carreira, e acaba de executar mais uma com “Saviors”.

Há uns bons álbuns que Billie Joe Armstrong (vocais e guitarra), Mike Dirnt (baixo) e Tré Cool (bateria) não se mostravam tão focados assim. E a determinação aqui parece ter sido a de recuperar a energia e a concisão pop que os projetaram para o mundo na juventude com a fábrica de hits “Dookie” (1994), mais a virulência política e ambição rock de “American Idiot” (2004) – o disco que fez deles uma banda importante.

Sendo assim, “Saviors” segue uma trajetória admirável, que começa com “American dream is killing me”, faixa na qual são enumerados quase didaticamente os causadores do grande mal-estar dos tempos atuais. Ela passa ainda por “Strange days are here to stay” (“desde que Bowie morreu, nada mais foi o mesmo”) e pela faixa-título (a do diagnóstico cruel “todo mundo dorme, mas ninguém sonha”), para terminar com “Fancy sauce”, um daqueles glam rocks muito emocionais, que aproveita a sua força de canção para tocar a real da humanidade: “Todos nós vamos morrer jovens um dia.”

Com um rock inacreditavelmente fresco, capaz de recriar de maneira convincente, num grande exercício estilístico, todas as ondas da juventude desde os anos 1950, os cinquentões do Green Day preenchem “Saviors” com um bocado de músicas boas. Eles cantam em alto e bom som o absurdo (“Living in the 20’s”) e a estupidez (“Look ma, no brains!”), mas também o amor, que surge como tábua de salvação em tempos tão estranhos (“Bobby Sox” e “Suzie Chapstick”, nesse sentido, são canções exemplares).

“Saviors” se permite fazer graça com o fim do mundo de forma retrô, lembrando dos anos 1980, quando bombas atômicas ameaçavam varrer a humanidade da Terra, na punk “1981” e na new wave “Coma City” (a que aponta o dedo para essa gente que, plenos 2020, está “falindo o planeta para mandar cretinos ao espaço”). Indo mais longe no tempo, o Green Day ainda faz, em “Corvette Summer”, uma paródia envenenada de hard rock escapista dos anos 1970 (“estou doente e entediado / leve-me para o pronto socorro / ou para a loja de discos”).

É de se admirar que “Saviors” ainda traga uma música tão terna quanto “Father to a son”, de um pai admitindo para o filho que “o amor pode ser mais assustador que a raiva”. Mas é tão somente o Green Day mostrando que ainda é capaz de traduzir em canções poderosas as belezas e angústias da vida nesse planetinha muito surtado.

Fonte: O Globo