Desmonte do Estatuto do Desarmamento: retrocesso que ameaça a segurança pública
A fragilidade da democracia brasileira é evidente não só pelas últimas revelações do quase-golpe de Bolsonaro e as incursões de alucinados lobos solitários. Bastou o presidente Lula se ausentar por motivo de doença que, em uma semana, a Câmara dos Deputados botou uma de suas asas – a da extrema direita – de fora. Nesta semana, foi aprovado um pacote de maldades que inclui desde castração química até uma absurda e indefensável anistia a armas ilegais, que beneficia tão somente o crime organizado.
O projeto de lei que fragiliza pilares fundamentais do Estatuto do Desarmamento é um golpe direto à segurança pública e ao esforço histórico para reduzir a violência armada no Brasil. A proposta autoriza que investigados por crimes graves possam adquirir armas e concede uma espécie de anistia para quem possui armas irregulares, ignorando décadas de avanços na regulamentação do armamento civil.
Caminho aberto para o caos armado
O Estatuto do Desarmamento, criado em 2003, foi um marco no controle de armas no país, contribuindo para evitar milhares de mortes. A flexibilização dessas normas coloca em risco não apenas a vida de inocentes, mas também a credibilidade do sistema legal. Ao permitir que investigados por crimes hediondos ou de violência possam comprar armas, o projeto abre a porta para que potenciais criminosos tenham maior acesso a instrumentos letais.
A exclusão de crimes como corrupção, porte ilegal de arma e maus-tratos da lista de impedimentos agrava ainda mais o cenário. É inconcebível que um país que enfrenta uma crise de segurança e corrupção flexibilize o acesso às armas, ignorando o impacto devastador dessa decisão. Como destacou Bruno Langeani, especialista do Instituto Sou da Paz, “a simples sinalização de uma anistia tem um efeito prático enorme para que as pessoas parem de se preocupar com regularizar suas armas”. Na prática, isso incentiva o descaso com as leis e a proliferação de armamentos ilegais.
Uma anistia perigosa e injustificável
A chamada “anistia” para armas irregulares é um dos aspectos mais preocupantes do texto. Sob o pretexto de tornar visível o arsenal “invisível” para o poder público, o projeto legitima a posse de armas adquiridas ilegalmente. Esse movimento não apenas enfraquece a aplicação da lei, mas também desmoraliza cidadãos que, apesar de discordarem das normas, optaram por respeitá-las.
O aumento do prazo para renovação do certificado de três para seis anos é outro ponto que dificulta o monitoramento do armamento no país. Tal medida fragiliza os mecanismos de controle e torna mais difícil identificar eventuais desvios ou irregularidades no uso das armas.
Interesses armamentistas acima da segurança
A aprovação do projeto, mesmo com concessões feitas pela base governista, evidencia a força da bancada armamentista, que impõe retrocessos sob a justificativa de proteger “direitos”. A falácia dessa argumentação está na desconexão com a realidade: mais armas em circulação significam mais crimes, não menos. O presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, alertou para o impacto dessas mudanças, afirmando que elas representam “um retrocesso grande” e podem até permitir que pessoas condenadas renovem o porte de armas.
A decisão também gerou incômodo no Ministério da Justiça, que vinha trabalhando para endurecer as regras de acesso a armas, sobretudo em áreas sensíveis como escolas. Essa postura incoerente, ao ceder a pressões de setores armamentistas, vai na contramão dos esforços por maior controle e segurança.
O Senado como última barreira
Agora, cabe ao Senado a responsabilidade de barrar essa proposta perigosa. O presidente da Casa, Rodrigo Pacheco, já manifestou reservas ao texto, mas é essencial que os parlamentares considerem o impacto devastador que ele pode ter na sociedade. O Brasil não precisa de mais armas em circulação; precisa de mais políticas públicas eficazes para combater a violência.
Flexibilizar o acesso a armas é caminhar na direção contrária ao que as evidências indicam. As armas não protegem, elas matam. Este projeto, se aprovado, representará um retrocesso histórico, colocando em risco a vida de milhões de brasileiros. A sociedade precisa se mobilizar para que o Senado rejeite essa afronta à segurança pública e aos valores democráticos.