Consciência Negra: com rodas de samba, feijoada e eventos, quilombos do Rio se firmam como polos culturais
Os músicos do Samba Sacopã se reúnem em volta das mesas de plástico, cada um com seu instrumento, do tamborim ao bumbo. A noite começa a dar as caras e o cheiro da feijoada ainda paira no ar. Clássicos de Paulinho da Viola, Beth Carvalho e Dona Ivone Lara ganham corpo com o coro que se forma ao redor. Todo segundo sábado do mês, a cena se repete no Quilombo Sacopã, no alto da rua de mesmo nome, na Lagoa. Ocupado há mais de 100 anos pela família de Luiz Sacopã, reconhecido como quilombola em 2014, o lugar começou a promover eventos abertos ao público há dois anos e, desde então, o movimento ali só cresce.
— Começamos com amigos, e os amigos trazem amigos, que trazem outros — conta Rosane Garcês, que toca o espaço com o marido, Luiz Martins (filho de Seu Luiz), nascido lá.
A auxiliar de saúde bucal Maristela Rodrigues Pereira, de 43 anos, é frequentadora assídua.
— Fico encantada com a energia do lugar, me sinto em casa. Boa comida, música de qualidade, história, muita natureza, vista para o Cristo… tudo o que o carioca gosta — diz.
Como o Sacopã, outros quilombos urbanos do Rio, espaços de preservação da cultura e identidade negras — no estado, segundo a Fundação Palmares, há 40 comunidades do gênero reconhecidas oficialmente — têm atraído gente de toda a cidade com uma farta e animada programação ao longo do ano.
Às sextas, sob a lona montada no quintal do Quilombo Ferreira Diniz, na Glória, uma turma bate ponto atrás da famosa feijoada da Tia Cida. Na Casa do Nando, no Centro, há saraus, shows e outros eventos, quase sempre lotados.
Com a chegada do Dia da Consciência Negra, na segunda-feira, as atividades se intensificam, com conversas, feijoadas e rodas de samba.
Quilombo Sacopã
Ao som do Samba Sacopã, a feijoada é servida à vontade (R$ 50) no segundo sábado de cada mês, a partir das 14h (entrada a R$ 20). Nesta segunda, tem repeteco. O dia começa com uma roda de conversa com Bia Nunes, presidente da Associação Estadual das Comunidades Quilombolas (às 10h) e roda de jongo. Rua Sacopã 250, Lagoa.
Quilombo Cultural Casa do Nando
O espaço, que já teve sua sede na Pedra do Sal e no Largo da Prainha, começou como um movimento espontâneo em 2013. O empresário e idealizador Fernando Luiz diz que foi uma forma de criar um ambiente acolhedor para as pessoas pretas, mas que todos são bem-vindos. Toda semana, o lugar tem uma dobradinha fixa: às quintas, é a vez do Pagode 90 (20h; R$ 20); às sextas, do Samba na Serrinha (18h; R$ 10). De quarta a sábado, o quilombo abre para almoço. A programação é diária até a próxima segunda, quando a roda Pede Tereza toma conta do espaço, com o Samba pra Zumbi (às 16h; R$ 25). Rua Camerino 176, Centro.
Quilombo Ferreira Diniz
Toda sexta, a feijoada da Tia Cida toma conta do quintal do quilombo, onde duas famílias moram há 70 anos. A entrada é grátis e o almoço custa de R$ 25 a R$ 35 (a partir das 12h). O que antes era um centro de distribuição de quentinhas para trabalhadores próximos virou um restaurante a céu aberto graças a uma ideia de Claude Troisgros, durante a pandemia. Mas em junho, depois de uma postagem nas redes sociais, o lugar encheu tanto que Cida teve que ir à feira comprar mais comida.
Agora, ela está preparada e recebe até 150 pessoas por dia. Excepcionalmente na segunda (20), para o Dia da Consciência Negra, há roda de samba com o grupo Pegada de Criolo (a partir das 14h), com entrada colaborativa revertida para os músicos e melhorias do quilombo, que vai ganhar uma horta e reformas no casarão. Rua Candido Mendes 320, Glória.
Quilombo do Grotão
A história do quilombo, no meio do Parque Estadual da Serra da Tiririca, em Niterói, começou nos anos 1920. Mas foi em 2002 que as portas se abriram para o público, com feijoada, capoeira e samba. Hoje, a programação atrai mais de 300 pessoas por dia no fim de semana. No sábado, o grupo Um Amô abre os trabalhos (a entrada é 2 kg de alimento), que seguem no domingo com a roda de samba Oxé do Quilombo e feijoada (R$ 40), sempre a partir das 14h30. Segunda (20), tem rodas de capoeira (11h), de rap (13h) e de samba (15h). Rua Maria Luzia Gomes da Costa, Sítio 77, Engenho do Mato.
Fonte: O Globo