Esporte

Associação do Ministério Público vai ao STF contra decisão que destituiu Ednaldo Rodrigues da CBF

A Associação Nacional dos Membros do Ministério Público (Conamp) foi admitida como amicus curiae (amigo da corte) pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em uma ação que pede a suspensão da decisão que destituiu Ednaldo Rodrigues da presidência da CBF (Confederação Brasileira de Futebol).

Integrada por membros do Ministério Público dos estados e da União, a entidade de classe afirma ter havido “graves lesões à atuação constitucional” do órgão em função de decisões tomadas pela 21ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro —e defende sua anulação.

“Tendo em vista a relevância da questão constitucional discutida e a representatividade da postulante, defiro o pedido”, decidiu o ministro Gilmar Mendes, ao acatar a solicitação de ingresso da Conamp como amicus curiae. A Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) chegou à corte por iniciativa do PC do B.

Ednaldo Rodrigues foi destituído da presidência da CBF em 7 de dezembro do ano passado. Ele chegou ao comando da entidade após o afastamento de seu antecessor, Rogério Caboclo, alvo de denúncias de assédio contra funcionárias.

À época, Rodrigues presidia a CBF interinamente e firmou um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público Federal (MPF) do Rio de Janeiro, o que abriu caminho para fosse eleito mais tarde e efetivado no cargo.

O termo de ajustamento foi resultado de uma ação movida pelo órgão em meados de 2018, que questionava a CBF em relação ao processo eleitoral para a presidência da confederação.

Alguns dos vice-presidentes da confederação na gestão Caboclo, porém, se sentiram prejudicados e questionaram a validade do acordo, agora julgado ilegal pela Justiça. Ao analisar o caso, o tribunal fluminense considerou que o Ministério Público não tinha legitimidade para ajuizar o acordo.

Para a Conamp, as decisões da Justiça do Rio são “teratológicas” e teriam sido tomadas “de forma arbitrária”, em desacordo com o que prevê a Constituição.

A associação sustenta que a Justiça não só teria contrariado o princípio constitucional de autonomia da CBF como também proferido decisões a partir da provocação de pessoas que não integram mais a confederação nem representam o Ministério Público, favorecendo “interesses individuais e privados”.

“Decisões deste tipo são inconstitucionais e ilegais e prejudicam a sociedade, em especial trabalhadores, consumidores e torcedores, pois violam prerrogativas constitucionais do Ministério Público em defesa do patrimônio cultural do país, dos trabalhadores empregados pelo futebol brasileiro e de todos os seus consumidores e torcedores”, afirmou a entidade ao STF.

“A suspensão dos processos e efeitos dessas decisões são ainda mais urgentes para defender a capacidade de geração de emprego e renda do desporto nacional na economia do Brasil, que não pode ser ameaçada por decisões teratológicas que contrariam todo ordenamento jurídico desportivo nacional e internacional, com interpretações completamente desconformes com a Constituição”, disse ainda.

A entidade alerta que a intervenção judicial sobre a CBF pode incitar a aplicação de sanções pela Fifa (Federação Internacional de Futebol), que rechaça a interferência de terceiros na gestão de confederações e associações.

A Justiça determinou que José Perdiz, presidente do STJD (Superior Tribunal de Justiça Desportiva), indicado como interventor na CBF, convoque eleições em janeiro. Tanto a Fifa quanto a Conmebol (Confederação Sul-Americana de Futebol) já afirmaram que não reconhecem a intervenção.

As duas entidades enviaram ofícios à CBF alertando sobre os riscos em caso de interferência externa e reafirmando que o estatuto da federação mundial “obriga as associações membros a gerir os seus assuntos de forma independente, sem influência de terceiros, incluindo quaisquer entidades estatais”.

“Há risco concreto, grave e de difícil reversibilidade […] de não participação da seleção brasileira do torneio pré-olímpico e dos Jogos Olímpicos de Paris, e de abruptas suspensões administrativas pela Fifa e Conmebol —o que comprometeria a própria prática de futebol profissional e não profissional (masculino e feminino) em todo o país”, afirmou a Conamp ao STF. “O risco é iminente e gravíssimo.”

O pedido de ingresso da Conamp como amicus curiae na ADI é assinado pelos advogados Aristides Junqueira Alvarenga e Juliana Moura Alvarenga Diláscio.

Após a publicação deste texto, o presidente da entidade, Manoel Murrieta, enviou uma nota à coluna em que reforça que o ingresso da Conamp na ação busca pleitear a manutenção do TAC firmado pelo Ministério Público, e não atuar em defesa de integrantes ou ex-integrantes da CBF. Leia, abaixo, sua íntegra:

“O pleito de ingresso da Associação Nacional dos Membros do Ministério Público – Conamp, na condição de amicus curiae na ADI nº 7.580, cinge-se a reafirmar a posição da entidade na garantia da preservação das prerrogativas constitucionalmente garantidas aos membros do Ministério Público.

O interesse da Conamp no caso visa a manutenção da higidez das atribuições do Ministério Público e refere-se à decisão da Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, que anulou o Termo de Ajustamento de Conduta – TAC celebrado entre o MPRJ e a Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

A decisão, no entender da Conamp, viola o dever constitucional do Estado, via Ministério Público, de defender os consumidores, assim como a própria autonomia e a independência funcional dos membros do Ministério Público para celebração de TACs.

O ingresso da entidade na ação tem o intuito de evitar graves lesões à atuação constitucional do Ministério Público, especialmente no que diz respeito à legitimidade e autonomia para celebração de termos de ajustamento de conduta que envolvam, direta ou indiretamente, relações de consumo com entidades desportivas integrantes do Sistema Nacional do Esporte.

Fonte: Folha de São Paulo